Partilhando o primeiro encontro nordestino

 
Amigas e amigos no Darma, 

Escrevo para partilhar com todos vocês que o Primeiro Encontro Nordestino com praticantes e construtores de Sangas da linhagem do Mestre Zen Thich Naht Hanh, realizado entre os dias 15-17 de maio, na Serra do Xammaiar, Chã Grande, PE foi um final de semana muito feliz e significativo para nós participantes. Sete mulheres, na faixa etária dos 40 aos 56 anos, corajosamente interromperam as suas rotinas repletas de afazeres para se reunirem, com o propósito de passar um final de semana partilhando e convivendo como uma verdadeira família espiritual. O evento contou também com a energia solidária de praticantes de outros estados do nordeste: Fortaleza, Salvador e Natal que, por motivos de força maior, não puderam comparecer, mas que nos escreveram apoiando de todo o coração, ou até nos ajudando à distância. As retirantes vieram de diferentes municípios de Pernambuco: Caruaru, Chã Grande, Aldeia e Recife - com exceção de uma que veio de Alagoas. Vieram em busca de harmonia, paz interior e crescimento espiritual, além do interesse de conhecer práticas meditativas para aprender a se relacionar melhor tanto consigo mesmo como com os outros, e movidas também pelo desejo de meditar junto com quem esteve em Plum Village e conviveu com a Sanga de Thây e recebeu ensinamentos diretamente deste Mestre vivo realizado. Estas motivações foram explicitadas por elas mesmas em suas fichas de inscrição. 

Sem dúvida, este retiro de consciência plena foi uma experiência bem sucedida. No meu entender, o seu êxito deveu-se, em parte, ao contagiante entusiasmo, interesse, pontualidade e abertura mental e de coração das retirantes, durantes todas as sessões agendadas no programa.Como também, em parte, deveu-se à harmoniosa atmosfera que reina na chácara de Clara Feitosa, e ao apoio inabalável e dedicação com que ela se empenhou para nos receber. As refeições preparadas com tanto carinho por Jô também nos nutriram de forma muito especial. A mensagem que cada participante deixou gravada em nossa última sessão ilustra bem melhor tudo o que estou tentando descrever a posteriori:  

Quitéria: Estamos terminando estes momentos preciosos que vivemos aqui. Sei que cada um de nós está em algum ponto nesta caminhada em direção da consciência plena. E porque cada um está em algum ponto é que pudemos realizar tudo do jeito que a gente realizou..., não é? Prá mim, duas coisas importantes que eu vou levando daqui, entre várias outras, é o fato de que eu ando indócil com a civilização a que pertenço, mas estes momentos que vivenciamos aqui, que eu vivenciei junto com todas vocês me fizeram ver que eu posso buscar felicidade mesmo nesta civilização, que eu tenho em alguns momentos renegado e tenho estado muito pessimista com relação a ela, por estar num contexto que destrói que é interesseiro, que é individualista, que mata e que não valoriza a vida. E outra coisa que eu vou levando também, é que uma das pessoas com quem eu convivo profissionalmente, e que eu me lembrei muito dela hoje - inclusive mostrei na foto a vocês - ela cometeu o assassinato da própria filha, um bebê de oito meses e eu não via como passar pra essa pessoa que ela podia buscar felicidade depois de ter feito isso. Ela fez isso em um surto psicótico. Mas hoje ela está compensada, e o meu medo é exatamente neste período, nesta fase de lucidez de não saber como ajudá-la a enfrentar a situação. E hoje eu vejo que eu acredito que ela pode buscar a felicidade. E eu acredito também que posso passar essa crença pra ela. Eu posso ajudá-la melhor do que eu estava podendo ajudar antes. Fico muito grata por ter participado deste retiro, destes momentos e estou levando muita coisa boa. Estou muito feliz e agradecida. 

Clara: [Ela se levanta, grava o seu nome, faz uma prostração, em seguida disse: "falei".]  

Fátima: Nesse momento eu já não tenho muito que falar porque desde ontem que eu falo da minha gratidão e de como foi bom ter vindo, ter aceitado o convite e está aqui participando, e ter a energia de cada um dessa pequena sanga e como já demonstrei também hoje minha gratidão à Goretti por compartilhar isso, que é uma continuação do que ela já vem fazendo pela internet há vários anos, com os textos que ela tem nos enviado. É muito precioso pra gente ter alguém que possa fazer estas traduções e compartilhar com a gente. Então é isso: o caminho prossegue; a caminhada prossegue e fico grata pela energia de todos. 

Sônia: Agora o momento é de agradecimento. Eu agradeço a todos a oportunidade por estar participando deste encontro e aprendendo este novo conhecimento de estar no momento presente, de ficar no aqui e agora. Obrigada. 

Lisley: Estou grata por estar neste momento, neste encontro maravilhoso, estou saindo preenchida espiritualmente: de conhecimentos, de força, de compaixão, de amizade, de amor mútuo incondicional. E que hoje eu reconheço o quanto a gente precisa estar em conjunto com outras pessoas, fazendo estas trocas, essas vivências, para que a humanidade, aos poucos, reconheça o quanto tem que retornar ao amor. E uma frase que eu sempre gostei e que quero deixar, e que ativa tudo o que vivenciei aqui neste momento: “Um dia, uma vida, amor sempre vivo; aqui e agora, com a consciência plena nós estamos muito felizes”. Eu quero mais uma vez agradecer a todas vocês.  

Joana Darque: Mais uma etapa, né? Mais um final de semana de reflexões, de busca da consciência no aqui e agora. Quero dizer a Goretti da imensa gratidão por ter trazido estes ensinamentos que acordou mais uma vez dentro de mim o desejo de buscas. Porque caminho, nada está terminado. Eu achei muito lindo quando você colocou a palavra “inter-relação”. E essa foi também uma coisa nova que eu vivi aqui, muito boa, muito forte. Eu nunca tinha participado de nada assim relacionado ao Budismo – embora tenha muita vontade de conhecer o budismo. Eu adorei, gostei, estou saindo daqui com um monte de consciências, de reflexões, de consciência das vacas amarradas, algumas soltas, outras ainda estão no meu curral. E quero agradecer à Thây pelo ensinamento das vacas, foi ótimo! E quero dizer a você que não pare isso aqui não. Que aqui seja o seu começo. Que você leve esses ensinamentos para outras pessoas, em outros lugares. A gente nunca sabe o que vai fazer e a gente nunca está pronta. Pronto se faz na hora. A única coisa que fica pronta é um pacote. E geralmente um pacote não é bom. Então boa sorte! Estou muito grata. E um excelente kin pra você a partir de hoje.  

Maria Goretti: Eu acho ótima essa prática de falar a partir do coração; falar pra pensar, no aqui e agora. É uma prática muito revolucionária, eu diria. Por que no mundo a gente veste tantas máscaras, a gente desempenha tantos papéis e a gente perde contato com esta fonte, que é o nosso coração, a nossa verdade. Então é muito importante a gente praticar isso. E esse é o caminho da compreensão e do amor que vem do coração. Do coração da sabedoria, o coração de tudo. Então, eu também estou muito grata com a presença de todas vocês. Foi uma experiência inédita pra mim. Fiquei assim muito impressionada com o interesse de vocês todas pelas práticas porque muita gente vem de outras tradições, de outras religiões, ou não tem religião, e ir tão fundo assim na meditação... Pra mim foi surpreendente! Inclusive participando dos rituais, das oferendas, das práticas de cânticos, as 5h30m da manhã! e sempre com o coração aberto para aprender e cantar e estar presente, inteira. Enfim eu fiquei muito feliz de ver tudo isso e me sinto muito realizada. Quero aproveitar a oportunidade para pedir desculpas se, por alguma inabilidade minha, eu cometi algum equívoco ou feri alguém. Só teve duas coisinhas que eu gostaria de ressaltar nesta reflexão do que vivenciamos nestes últimos dias, que tem a ver com o silêncio e a escuta do sino. Eu entendo que o rendimento poderia ter sido ainda mais profundo se tivéssemos determinado períodos para a gente treinar o estar em silêncio, ou estar sem conversar, sem interagir através da fala. A gente para de falar como um auxílio para silenciar ou não agitar tanto a mente. Mas de qualquer forma não podemos ser tão exigentes e perfeccionistas, pois estamos só iniciando... E se isso aconteceu certamente tem a ver com a minha inabilidade de expressar-me com clareza com relação a este ponto. A prática da escuta do sino é uma oportunidade que temos durante a vida normal de realmente parar, interromper, desenvolver esse poder de interromper e nos voltarmos para junto da nossa respiração, retornar ao nosso verdadeiro lar que está dentro de nós, e dizemos silenciosamente para nós mesmos: “escute, escute! Este som maravilhoso me traz de volta ao meu verdadeiro lar.” Treinando, desta forma, a escutar o sino, desenvolvemos a habilidade de parar uma formação mental negativa quando ela surgir na nossa mente. Teremos esse poder de interrompê-la, pará-la. Se eu estou fazendo alguma atividade, o sino toca e eu não consigo parar, então como é que eu vou conseguir parar, segurar as rédeas da minha energia mental em situações muito mais desafiadoras? Mas acho que também não fui muito clara com relação a isso... Mas, no entanto, quando o sino tocava na sala de meditação eu senti que todo mundo entrava no clima maravilhosamente bem, apesar de não ser assim nas situações da vida cotidiana. 

Bem gente, eu gostaria de sugerir que a gente cantasse e gravasse. Vamos? Todo mundo concordou e cantamos e gravamos mais de dez canções... 
That is it! 
Com amor e sorrisos, 
Tâm Van Lang